Sr. Presidente da Assembleia Nacional,
Srs. membros do Governo,
Colegas Deputadas e Deputados,
Nesta interpelação ficou evidente que o Governo não sabe o que, efetivamente, quer e nem qual o rumo que deve imprimir à politica para o sector da habitação, apesar de ter assumido, no seu programa de governação, que “será promovido um grande Programa de Habitação”, que “responda às necessidades e às capacidades financeiras reais das famílias…”.
Durante esta interpelação o Governo:
a) Não apresentou nenhuma visão consistente e estruturada para o sector da habitação e tão pouco as “soluções” para fazer face ao elevado défice habitacional existente;
b) Não deixou nenhuma nota de esperança às mulheres chefes de família que enfrentam todos os anos a época chuvosa, com o coração nas mãos;
c) Aos jovens, com salários, cada vez, mais baixos e empregos precários, não apresentou nenhuma alternativa aos empréstimos existentes no sistema bancário que, como sabemos, não são acessíveis a todos;
d) Não apresentou nenhuma medida de política dirigida aos carenciados que almejam ter acesso a uma habitação condigna;
e) Rejeitou, mais uma vez, o Programa “Casa para Todos”, abandonando as casas construídas apenas para poder, com o coro dos seus acólitos, denegrir todas as medidas de política encontradas, mas não apresentando nenhuma alternativa;
f) Não evidenciou nenhuma ideia clara sobre o destino que pretende dar à IFH, depois de passar dois anos a denegrir esta instituição na Praça Pública e de ter passado a ideia que a IFH ocupa um espaço que devia ser reservado ao sector privado;
g) Não deu garantias sobre a continuidade do Cadastro Predial que, após o projeto - piloto LAND, financiado no âmbito do MCA II, devia ser continuado para que todo o país fosse cadastrado;
h) Não demonstrou nenhuma medida para o reforço das políticas do Ordenamento do Território e da boa gestão dos solos;
i) Apesar de ter herdado projetos estruturantes, programas e parcerias como o Programa Nacional de Desenvolvimento Urbano e Capacitação das Cidades, o Projeto Land e toda a arquitetura jurídica para o alargamento do Cadastro Predial a todo o país e a Infraestrutura de Dados Espaciais de Cabo Verde a funcionar, o Governo não consegue explicar quais são as suas políticas para enfrentar todos os desafios ligados ao Ordenamento do território, gestão de solos e habitação, questões essenciais para o desenvolvimento do país nesta etapa.
Senhores Deputados,
O mundo muda, as opções de aquisição de habitação mudam, a mobilidade inter-ilhas intensifica-se, e o Governo não consegue explicar como perceciona e pretende enfrentar este desafio, e insiste que ou o mercado ou a CM hão-de o resolver!
Enquanto isso, os funcionários com baixo salários, as famílias jovens, os idosos que não têm propriedade, os emigrantes que vêm trabalhar no nosso país, continuam a ter dificuldades em aceder ao solo, ao crédito e a suportar os custos de um crédito habitação.
Enfim, volvidos quase dois anos da tomada de posse do atual Governo, não se conhece, ainda, nem a visão, nem os objetivos, nem os eixos estratégicos do aludido Programa Habitacional e, muito menos, os resultados e/ou as metas.
Para todos esses problemas o Governo fala do PRAA, que está longe de cumprir a missão dos programas anteriores.
Lamentavelmente, e durante o debate, o MPD preferiu refugiar-se nos ataques ao passado, no apontar de dedos a quem fez e deixou trabalho, numa espécie de fuga em frente, caraterística de quem, até ao momento, não consegue provar ao que vem, não consegue dar sinais de, efetivamente, ter uma estratégia para levar a cabo suas políticas, pomposamente anunciadas por altura da campanha eleitoral, em 2016. Ficou patente e claro que o MPD quis desviar o debate do cerne da questão, tentando desresponsabilizar-se pelo que não consegue fazer, esquecendo-se de que estamos já em 2018 e praticamente tem mais dois anos de Governação e que não foi eleito para criticar o PAICV, mas para governar e implementar políticas públicas em benefício dos cidadãos.
Não! O Governo perde dois anos em maledicências, quando poderia, com humildade e responsabilidade, ter assumido o que está bem definido e bem feito, corrigir o que, eventualmente, estiver errado, pois quem faz acerta e erra.
A verdade é que as linhas de orientação que o Governo e o MPD tentaram “rascunhar” neste debate constam todos dos eixos estratégicos do programa “Casa para Todos”, do Programa Nacional de Desenvolvimento Urbano e Capacitação das Cidades, dos Perfis Urbanos de Cabo Verde e dos centros urbanos elaborados em parceria com a ONU-Habitat e os municípios, com recurso à abordagem participativa.
Não seria mais sério e responsável poupar esse tempo investido no desdenhar demagógico das ideias encontradas e na linha do ditado popular que diz que “quem desdenha quer comprar”, e assumir logo o que, reconhecidamente, era válido e avançar?
Esta ausência de visão e estratégias para o sector só contribuirá para acentuar o défice de planeamento urbano, a má gestão dos solos e do território, sobretudo nos centros urbanos de maior crescimento, (o acesso ao solo infraestruturado é cada vez mais raro e caro e cada vez mais raro o acesso ao solo pela concessão pública (aforamento ou compra). Imaginem que aqui na capital agora até obrigam os proprietários a comprar o seu próprio terraço, para poder alterar a planta e expandir o prédio, muitas vezes sem uma adequada verificação da solidez da estrutura, o que pode multiplicar os riscos existentes em toda a cidade. Não há planos e nem limitações de edificabilidade, quem tem dinheiro paga, constrói, as CMs encaixam e os problemas urbanísticos e construtivos complexificam-se.
Contrariamente ao Governo anterior que desenhou e desenvolveu uma visão estratégica para habitação, prevendo uma série de medidas e estratégias para promover a habitação social em todo o país, buscando criar as condições para o cumprimento gradual de uma das determinações constitucionais - direito a habitação condigna -, a atual maioria do MPD, quiçá pela ideologia que lhe é caraterística, desmantelou este que era um dos maiores programas de cariz social levado a cabo por um Governo da República, e, em contrapartida, não coloca sobre a mesa para o debate nenhuma alternativa para as centenas de famílias carenciadas (e sem habitação condigna) que, ansiosamente, aguardam a oportunidade de ter acesso às casas da Classe A e nem tão pouco equaciona e resolve os problemas para as centenas de jovens quadros (e não só) que se candidataram ao programa e que, até hoje, aguardam uma resposta para terem acesso à habitação.
O quê que o Movimento Para a Democracia fez nestes quase dois anos em matéria de habitação? Qual foi e qual é a sua política habitacional? Maldizer, denegrir, desmantelar o que encontrou, perder tempo, para voltar aos instrumentos de política encontrados e retirando-lhes os critérios de transparência, os requisitos de acesso definidos por lei publicados no BO; apresentar-nos o PRAA.
Mais! Querem, à semelhança do que fizeram em 1999, mudar a natureza do IFH, dizendo que já há condições no mercado para resolver o problema habitacional em Cabo Verde e assim entregar esta empresa de mão beijada a uma classe empresarial bem identificada e próxima do partido.
Mas estamos de olho!
Ficou claro do debate, que a política social de habitação não é prioridade das políticas públicas, do atual governo, para os próximos anos. Quiçá porque, por força ideológica, a prioridade são outras ao invés de políticas públicas para resolver, por exemplo, o problema das barracas que proliferam um pouco pelas ilhas, em claro sinal que para eles a coesão social e o acesso à habitação condigna pelos mais carenciados não constituem prioridades.
Entende o PAICV que é preciso democratizar o acesso ao solo urbanizado, cumprindo a legislação existente no país e os Planos Urbanísticos em vigor, mas feitos letra morta pela maioria das Câmaras Municipais, com todo o beneplácito do Governo da República.
Por outro lado, as políticas de financiamento bonificado aos jovens e classes menos favorecidas precisam ser claras e transparentes e não podem continuar a ser utilizados maioritariamente por aqueles que podem mais. Sabe-se muito bem que o regime de bonificação criado na década de 90, tão demagogicamente politizada nesta Casa Parlamentar, carecia de recentragem para que efetivamente possa beneficiar as famílias que efetivamente precisam de políticas públicas e do apoio financeiro do Estado.
Senhores Deputados,
Quis-se provocar um debate sadio e frutífero entre os sujeitos parlamentares. Porém, a falta de visão e de propostas concretas do MPD para responder aos anseios da população deixou-nos preocupados. Preocupados, porque estamos perante um Governo e uma maioria que continuam a não assumir as suas responsabilidades. Durante três horas de interpelação, mais de metade do tempo foi utlizado para falarem dos 15 anos de governação do PAICV, pois há políticas e medidas concretas do passado, passíveis de serem criticadas, mas não há políticas do presente passíveis de comparação, nem projetos novos consistentes passíveis de serem apresentados à Nação e à oposição para acolher o seu apoio.
E isso é preocupante! O futuro e a felicidade prometida aos cabo-verdianos não serão alcançados dessa forma, senhores deputados.
Cabo Verde quer um Governo que tenha a capacidade de trabalhar para o seu futuro e não para justificar a sua incapacidade com as eventuais “falhas” do que foi, de boa-fé e com dedicação, feito por outro governo tão legítimo quanto este.
Mas o PAICV, enquanto alternativa de governação, quer contribuir para que os cabo-verdianos tenham esperança no futuro. Por isso, aqui estamos para contribuir com ideias e para apoiar as boas políticas, se forem adotadas.
Para o PAICV uma verdadeira política de Habitação é aquela que responde às nossas necessidades atuais e aos desafios dos novos tempos em que vivemos. Ela passará, necessariamente, por políticas públicas integradas que combinem as dimensões de planeamento território, de gestão eficiente e eficaz do solo urbanizado, de sistema de financiamento acessível e bonificado para classes menos possedentes, de democratização do acesso a solos, de segurança fundiária e da propriedade, para que as famílias e as empresas possam ter acesso a solos de forma democrática e equitativa.
A recentragem dos instrumentos de financiamento da politica de habitação, para que sejam efetivamente dirigidos aos que devem merecer a atenção prioritária do Estado; a continuação da reforma do mercado de arrendamento, para que este seja também uma via de acesso à habitação condigna e a preços compatíveis com a capacidade de pagamento das famílias. Para tal, há que continuar a rever a fiscalidade e a parafiscalidade urbana. Urge uma reforma, mais moderna, do IUP para que, devendo ser uma fonte de receita municipal, não seja transformada numa inibição para aqueles que queiram adquirir propriedade urbana, construir e assim participar na resolução das necessidades habitacionais.
Nalgumas ilhas, as habitações de classe B deviam também entrar no leque das habitações disponíveis para políticas sociais, tendo em conta a dimensão do défice e o grau de mobilidade de pessoas e famílias, com recurso a mecanismos como arrendamento, arrendamento resolúvel, permuta por residências noutras ilhas e terrenos, como aliás previa o Sistema de Habitação de Interesse Social.
Outra questão que precisa ser devidamente tratada, num futuro Plano Nacional de Habitação, é o mapeamento das zonas de risco devido às mudanças climáticas, para que as melhores soluções sejam encontradas atempadamente, por forma a assegurar a segurança habitacional de todos os cabo-verdianos.
Reiteramos, pois, as nossas preocupações face à ausência de uma visão clara! Mesmo assim, manifestamos a nossa disponibilidade para contribuir para que as melhores soluções sejam encontradas, num domínio em que o papel do mercado é importante, mas que as políticas públicas são, absolutamente, essenciais, sem demagogia, com transparência e sentido de pragmatismo e bem comum.
Muito obrigado!
Nuias da Silva - Deputado Eleito pelo Circulo Eleitoral do Fogo e Vice-Presidente do GP PAICV
FEVEREIRO 2018