A segurança é um bem fundamental para a população e para o desenvolvimento social e económico de qualquer Nação. Por isso, desde à Idade Moderna, impulsionado pela teoria contratualista de THOMAS HOBBES, a segurança constitui um dos fins mais importantes do Estado.
Em Cabo Verde, a Constituição da República é taxativa a este respeito. No catálogo dos Direitos Fundamentais, logo no seu artigo 30.º, n.º 1, estatui a Lei Fundamental: “Todos têm direito à liberdade e segurança pessoal.”
Dito de outro modo, nos termos da Constituição, constitui tarefa fundamental do Estado garantir a segurança dos seus cidadãos e de todos aqueles que fazem parte desta comunidade.
Excelências,
É mister reconhecer que, cumprindo a Constituição, no limite consentido pelos, ainda, parcos recursos financeiros do País, os sucessivos Governos da República têm adotado políticas públicas e feito investimentos relevantes no setor da segurança, para que todos os cabo-verdianos possam ter o almejado direito à liberdade e segurança, pessoal e dos seus bens.
De igual sorte, torna-se míster reconhecer que, apesar das políticas definidas e dos investimentos realizados no setor da segurança, as ocorrências criminais em Cabo Verde, de um modo geral e ao longo dos anos, mantiveram uma tendência de crescimento. Este facto é expressamente reconhecido em estudos abalizados e autoridades insuspeitas, designadamente pelo Instituto Nacional de Estatística, no estudo sobre Justiça e Segurança, realizado em 2015.
Senhor Presidente,
Senhor Ministro,
Colegas Deputadas e Deputados
O MpD, aproveitando-se da conjuntura particular vivenciada em 2015, em que se registaram mais 2.434 ocorrências em relação ao ano 2014, fez da segurança o seu cavalo de batalha durante a campanha para as eleições legislativas de 2016, o que, claramente, lhe rendeu importantes dividendos políticos.
O MpD prometeu aos cabo-verdianos e assumiu no seu Programa de Governação “tolerância zero em relação à insegurança”.
Hoje, volvidos mais de três anos após o inicio da atual Legislatura, os cabo-verdianos já não têm qualquer ilusão que a propalada “tolerância zero em relação à insegurança” não passava, e não passa, de mera estratégia de marketing político para conquistar votos.
Na verdade, Excelências, a questão que este Parlamento e os cabo-verdianos têm de fazer ao Governo e à maioria que o suporta é se a situação de insegurança e criminalidade prevalecentes no País é compatível com a propalada “tolerância zero em relação à insegurança”?
Desde logo, importa questionar se:
1. Os homicídios que vão acontecendo por todo o País, que nestes primeiros cinco meses do ano já ceifaram cerca de uma dezena de vidas humanas, são compatíveis com a propalada “tolerância zero em relação à insegurança”?
2. O desaparecimento de pessoas em Cabo Verde, incluindo crianças, é compatível com a propalada “tolerância zero em relação à insegurança”
3. Os casos frequentíssimos de abuso sexual de menores e de violência doméstica são compatíveis com a propalada “tolerância zero em relação à insegurança”?
4. Os roubos frequentes nas residências, nos estabelecimentos comerciais e nos locais de culto são compatíveis com a propalada “tolerância zero em relação à insegurança”?
5. Os furtos e, sobretudo, os famigerados “Cash or Body” a que estão sujeitos os cidadãos, designadamente nos centros urbanos deste País, são compatíveis com a propalada “tolerância zero em relação à insegurança”?
Não! Não são compatíveis, respondo eu.
Porém, este Parlamento e os cabo-verdianos assistiram, incrédulos, o contentamento com que, muito recentemente, o MpD exibia as estatísticas da Policia Nacional que, alegadamente, indicavam uma redução do registo de ocorrências criminais no País na ordem dos 18,5%.
O MpD tem perfeito conhecimento que nem todos os crimes são contabilizados nas estatísticas policiais, uma vez que, por motivos diversos, as vítimas e testemunhas de crimes podem não reportar o incidente à polícia e reportá-lo à Polícia Judiciaria ou diretamente ao Ministério Público. Por outro lado, existem crimes que são mais reportados, como é o caso do homicídio, e existem crimes que são menos reportados como é o caso dos crimes sexuais.
De igual modo, o MpD sabe que nem todas as subidas e descidas do número de ocorrências implicam subidas e descidas da criminalidade.
Na verdade, como é sabido, existem diversos fatores que podem fazer aumentar ou diminuir as ocorrências registadas que não o aumento ou redução da criminalidade.
Como ficou assaz demonstrado no documento do Instituto Nacional de Estatística sobre a Justiça e Segurança, o aumento da confiança na polícia e no sistema pode levar que a população passe a confiar mais na polícia e fazer com que cidadãos que anteriormente, provavelmente, não denunciariam um crime, passem a denunciar, o que origina um aumento de denúncias sem que haja necessariamente um aumento de criminalidade.
De igual modo, uma menor confiança pode provocar uma descida na denúncia de ocorrências.
Excelências,
É por demais evidente que os dados chutados pela maioria não espelham a realidade da criminalidade no País.
Tanto mais que, como entra pelos olhos dentro, a propalada redução da criminalidade não se traduziu, na prática, em redução do sentimento de insegurança e, consequentemente, na melhoria da segurança para os cabo-verdianos e seus bens.
Assim sendo, o que o MpD, efetivamente, pretende é desviar a atenção das pessoas face aos reais problemas de segurança que o País enfrenta e esconder a situação de fragilidade e ineficácia organizacionais reinantes na PN.
O MpD precisa compreender que nem o projeto Cidade Segura, nem as novas viaturas e outros meios operacionais da Policia Nacional e nem os salários melhorados combatem, de per si, a criminalidade.
Como alguém, com conhecimento da matéria e da instituição, já publicamente disse e passo a citar: “nunca na polícia houve tanto investimento, assim como nunca houve tanto descontentamento”.
Como em qualquer instituição, o principal ativo da PN é o capital humano. Porém, este ativo, como se pode constatar, é claramente ignorado pelo Ministro da Administração Interna.” Fim de citação.
Salta à vista de todos os cabo-verdianos que a gestão da Polícia Nacional é feita com base em um estilo de liderança autocrático e que as opiniões dos que pensam de forma diferente não são respeitadas. Mais, os seu autores são severamente punidos.
Qual o cabo-verdiano que não se recorda do ex-Comandante da Esquadra da ilha do Sal, senhor Elias, que foi severamente punido com a pena disciplinar de aposentação compulsiva, apenas por expressar uma opinião sobre a problemática do uso e porte de armas de fogo em Cabo Verde?
Qual o cabo-verdiano que não se recorda da manifestação, seguida de greve, dos efetivos da Polícia Nacional ocorrida em dezembro de 2017?
Qual o cabo-verdiano que não se recorda a forma prepotente como o senhor Ministro da Administração Interna lidou com as revindicações dos efetivos da Polícia Nacional e menosprezou a capacidade mobilizadora do Sindicato representativo da classe?
Qual o cabo-verdiano que não entendeu que a pena de aposentação compulsiva aplicada pelo Senhor Ministro da Administração Interna ao Presidente do Sindicato da Polícia constitui uma descarada represália e ameaça contra os grevistas e seus líderes?
Assim, desta forma, é fácil ser Ministro de Administração Interna.
Excelências,
O PAICV, com esta declaração política, mais não pretende do que chamar a atenção do Governo para a necessidade de um olhar mais atento e permanente em relação à segurança do cabo-verdianos e dos seus bens.
Os problemas com que o Pais se confronta a esse nível não são de todo compatíveis com os elevados níveis de insatisfação e desmotivação reinantes na Polícia Nacional.
Os investimentos não são fim em si. São instrumentos para se atingir um determinado fim.
Por isso, o Pais precisa de uma policia mobilizada, formada e motivada para dar combate à criminalidade
Mais do que isso, a Polícia Nacional precisa de uma liderança transformacional, capaz de motivar e integrar todas as vontades e de aproveitar as experiências acumuladas ao longo dos anos.
Só desta forma, os recursos investidos nos efetivos e nos equipamentos de combate à criminalidade terão os impactos almejados, qual seja a efetiva tolerância zero para com a insegurança.
MUITO OBRIGADO!