Sr. Presidente,
Srs. Membros da Mesa,
Sr. Primeiro-Ministro,
Srs. Ministros,
Caros Colegas Deputados,
Minhas Senhoras e meus Senhores:
Em cumprimento do Regimento da Assembleia Nacional, nas sessões dos meses de Outubro de cada ano, marca-se o início do Ano Parlamentar, com o Debate sobre a Situação da Justiça.
E pela práxis parlamentar há muito que passou esta Assembleia Nacional a analisar a situação da justiça com um olhar para além dos Relatórios dos Conselhos Superiores.
E não há pois que se pedir vénia a esta egrégia Casa, para que, em nome de uma mais cuidada análise sobre a situação da Justiça nos debrucemos também sobre o recente Relatório sobre a situação da Justiça em Cabo Verde realizado pelo Ministério da Justiça como sendo um Estudo, que visou passar a pente fino o Estado de nossa Justiça, sendo o segundo do gênero jamais realizado em Cabo Verde e que já foi objeto de acesos debates na Comunicação Social, nos últimos dias.
Porque falar deste Estudo já implica considerarmos os dados aqui apresentados sobre os dois Conselhos e muito mais, passando pelas instituições e agentes ligados à prestação da Justiça bem como uma vasta linha de informações em jeito de diagnóstico, que deveria pois nortear a definição das melhores politicas para a justiça.
Entretanto, uma nossa leitura, mesmo que fosse somente até a metade deste Estudo demonstra que algumas medidas que foram tomadas ultimamente não foram as mais acertadas, e que ao mínimo, deveríamos reanalisar algumas delas face a este diagnóstico.
Um Estudo que comprovou o acerto do anterior governo em algumas políticas e que deveriam merecer a nossa afeição na medida em que, afinal, serviam de suporte ao sistema judicial tal como ele é concebido.
Mas caros Colegas Deputados,
Sr. Presidente da Assembleia Nacional
Assim somos forçados a concluir, pois está plasmado neste estudo, que as duas instituições criadas em Cabo Verde que foram e são melhores avaliadas pelo cabo-verdianos, e nos quais os cabo-verdianos mais confiam, chegando a bater os 89% daqueles que foram inquiridos, são as “Casas do Direito” e a Ordem dos Advogados. E isto está na página 56, ponto 27.
E cremos que, perante estas informações iniciais, ser legítimo questionar: face a este cenário de avaliação e diagnóstico porque é que o Governo desistiu do conceito das “Casas do Direito”? O que esteve na base da sua exclusão do sistema de justiça, tendo em conta que este diagnóstico demonstra que o grau de sua avaliação é muito elevado, o mais elevado de todas as instituições? E essencialmente o que impede, já agora que seja resgatado este modelo de prestação do serviço de apoio judiciário aos mais desfavorecidos?
Por outro lado, se o Estudo avalia tão bem a prestação da OACV por que é que ao invés de se reforçar a sua capacidade foi excluída da política de justiça ligada à prestação da informação jurídica, que agora foi admitida em outros moldes já formalizados?
Não sei se vale a pena revisitarmos o texto da Constituição que reconhece esta instituição como indispensável na administração da Justiça! E, portanto, merecedora de um outro nível de tratamento e de relacionamento!
Colegas, todas as governações têm a sua bondade, os seus feitos, os seus erros e as suas virtudes, e os diagnósticos têm o condão de imprimir sentido às necessárias mudanças. E entendemos que há que dar tempo para que maturemos as opções governativas visando encontrar as melhores alternativas.
No entanto, convenhamos, uma coisa é nos comprometermos com a excelência e a sublimidade buscando estas alternativas outra, completamente diferente, é fazermos tábua rasa daquilo que dá certo. E aqui chamamos muita atenção ao governo!
Se já é preocupação dos cabo-verdianos a prestação da justiça, agora que os advogados sabem que não receberão por apoiarem as pessoas que não podem pagar pelos seus serviços, como ficarão os utentes destes serviços?
Nesta esteira, merece ainda um apontamento a ilegalidade que é a prestação do serviço de informação jurídica por pessoas sem conhecimento para o efeito em jeito de consulta jurídica e assistência judiciária.
Colegas, neste momento são os estudantes de direito que estão a dar consulta jurídica nos municípios e esta foi a solução encontrada e já é público e notório. E nós não concebemos a informação jurídica prestada nestes casos fora do âmbito de uma consulta jurídica.
E isto é ilegal é criminoso é exercício ilícito de atos próprios da advocacia sem autorização da OACV, pois quem os presta tem que estar avaliado e, depois, legalmente inscrito. Tal como receitar um remédio sem licença. E esta solução tem que ser abandonada, para o bem dos utentes dos serviços da justiça.
Aliás, o MJ já informou que fixou um montante insuficiente para arcar com os custos da assistência judiciária e já indicou que não é de sua responsabilidade o gabinete de apoio da OACV, que sempre foi assumido pelos sucessivos governos de Cabo Verde, menos este. Preocupa-nos, sobremaneira, a situação de deficiência que está neste momento o acesso à justiça por esta via, sendo um retrocesso para o setor. Sem precedentes!
O Ministério da Justiça já deixou claro que o problema dos tribunais não é a falta de meios.
E como meios entendemos humanos, financeiros e de materiais e equipamentos.
E esperamos aqui ouvir as medidas que serão tomadas e priorizadas por quem tutela o setor, porque queremos saber qual é o problema dos Tribunais então e como se pretende alterar o estado atual da justiça, que francamente desagrada até os próprios agentes da justiça.
O Ministério Publico não tem neste momento um parque automóvel, não tem veículos, e tem a metade dos funcionários de que dispõe os Tribunais. Precisa de mais magistrados e precisa concluir a autonomização das suas secretarias.
Quais destas serão priorizadas pelo Governo?
Os dois Conselhos precisam instalar as inspeções para que os magistrados e as secretarias possam ser avaliados ao longo do ano, como será isto realizado? Já há um plano conjunto a ser desenvolvido para o efeito?
O Ministério Público tem 100 mil processos pendentes, conforme resulta do Relatório apresentado.
Qual é a visão do Governo sobre esta situação que demonstra uma incapacidade de produção do Ministério Publico para além da demanda e que tipo de estratégia conjunta está montado ou por montar para que este acúmulo possa ser equacionado?
O Supremo Tribunal de Justiça produziu a metade do ano passado, mas teve seis Juízes, dos mais experientes e mais capacitados de Cabo Verde. Entretanto, porque não é sujeito a inspeção não se sabe a razão desta diminuição drástica de produção, produzindo os seis Juízes, em conjunto, menos que um único Juiz na primeira instância, podendo esta ser uma das razões que leva os cabo-verdianos a avaliá-la negativamente.
Pode ser a complexidade dos processos, podem haver causas que desconhecemos que podem perfeitamente justificar esta redução, mas sem o apoio do Governo para que se monte uma inspeção não se terá como analisar e identificar as causas para que se busque as mais ajustadas e adequadas soluções.
E perante esta situação gostaríamos de questionar se esta matéria tem sido objeto de análise pelo Ministério da Justiça. E quais são as soluções?
E para o exame destas e outras questões, legítimas, cremos e esperamos que sirva este debate.
Questões ligas à avaliação negativa em certos pontos das polícias pela sociedade segundo o estudo, questões ligadas às instalações das instituições do sistema judicial, questões ligadas à segurança, e questões ligadas à necessidade de introdução da Justiça social como forma de reduzir a conflituosidade e aquelas ligadas à criminalidade e aos impactos do policiamento de proximidade (cujos efeitos não sentimos, apesar de terem sido noticiadas de que já foram implementada desde o ano passado), passando pelo processo de reinserção social dos delinquentes e combate à delinquência juvenil onde temos mais falhado.
No debate do ano de 2016 tínhamos dito que “gostaríamos de por a tónica na importância de nos comprometermos neste momento com as medidas cabíveis e as políticas necessárias, cada um dentro de suas competências e com isto assumirmos os objectivos que cabo verde precisa alcançar como prioritários para que desde já possamos prosseguir esta desafiante caminhada para tornar o sector da justiça como um sector que dá satisfação ao nosso povo.” E neste momento, volvidos mais de um ano, devem agora estas medidas de política ser postas para avaliação, publicamente, para que possamos perspetivar o futuro analisando o que deu certo e o que precisa ser acertado ou reacertado.
Porque queremos que a justiça melhore, que seja mais eficiente, que sirva aos cabo-verdianos, que seja célere, estaremos aqui também para dar a nossa contribuição para que tenhamos cada vez melhor prestação da justiça em Cabo Verde.
Desejo um bom ano político e parlamentar a todos e que possamos debater sem paixões, pondo em crítica mas sem por em crise e que possamos sair daqui com propostas e sugestões como contribuições desta casa parlamentar.
Muito obrigado!