INTERPELAÇÃO SOBRE A POLÍTICA DE TRANSPORTES - DISCURSO DE ENCERRAMENTO

Senhor Presidente da Assembleia Nacional,
 
Senhores deputados e membros do Governo,                                                  
 
Excelências:
 
Ficou claro, nesta interpelação, que num País arquipelágico como Cabo Verde a organização de um sistema de transporte moderno, eficiente e eficaz, desempenha um papel crucial no processo de desenvolvimento, pois, deste depende, não só a mobilidade de pessoas e bens intra e inter-lhas mas também a ligação com o exterior e com a nossa vasta diáspora. 
 
Com este pressuposto a Governação do PAICV, no âmbito da vasta agenda de transformação competitiva do país, levou a cabo, durante a sua governação, um amplo e ambicioso projeto de infraestruturação e modernização do País, tendo priorizado, numa determinada etapa de desenvolvimento do país, a modernização, a ampliação e a construção de infraestruturas portuárias em quase todas as Ilhas do País, o alargamento da rede de aeroportos de nível internacional de um (1), em 2001, para quatro (4) em 2016, para além das obras de ampliação e modernização em toda a rede aeroportuária nacional.
 
Concomitantemente, reformas institucionais foram levadas a cabo, sobretudo no que tange à modernização do quadro regulatório aplicável ao sector de transportes aéreos que, apesar da pequenez do país e do mercado interno, foi distinguido com a Categoria 1 da Federal Aviation Administration, dos Estados Unidos da América, passou o exame com sucesso da primeira grande Auditoria CAT1, em finais de 2016, faz parte do TOP 10 dos países africanos que cumprem cabalmente as normas e as práticas recomendadas da ICAO e viu o seu prestígio reconhecido com a eleição de Cabo Verde, pela primeira vez, para ocupar um assento na Parte 3 do Conselho da ICAO. A Modernização dos serviços prestados na FIR Oceânica do Sal, a qualificação da gestão dos aeroportos nacionais, foram ganhos importantes que contribuíram para o prestígio de que Cabo Verde goza junto dos parceiros internacionais e regionais no que tange à organização e à gestão dos setores da aviação civil, aeroportos e segurança aérea.  
 
Com isso, pese embora as dificuldades que ainda afetam a companhia de bandeira nacional, ela e qualquer outra companhia de registo nacional pode aceder a um vasto mercado, graças ao prestígio e ao desempenho do País e da Entidade Reguladora Nacional, que assinou mais de 35 os Acordos de Serviço Aéreo com autoridades congéneres, ampliando assim largamente as possibilidades de realização de voos comerciais de e para Cabo Verde. 
 
Esforços foram também desenvolvidos no sentido de encetar uma profunda reforma do subsistema de transportes marítimos. Uma importante reforma institucional vinha sendo implementada: a criação da Agência Marítima e Portuária, a revisão do quadro legal e regulamentar do sector, a modernização e o reforço da capacidade técnica da Empresa gestora dos portos e a preparação da legislação visando a privatização da gestão dos portos, com especial relevância para os portos internacionais, a estruturação do Sistema de Busca e Salvamento Marítimo e a criação do Fundo SAR (Busca e Salvamento), a construção, equipamento e dotação dos Centros de Controle do Trafego Marítimo, entre outras medidas. 
 
Estudos vinham sendo desenvolvidos com o objetivo de levar avante uma reestruturação profunda dos subsistemas de transportes aéreos e marítimos inter-ilhas, desde a definição de um modelo de organização e operação, o estabelecimento de Obrigações de Serviço Público (OSP), para melhor responder às necessidades e aos objetivos de desenvolvimento de cada uma das ilhas. A reforma em processo visava essencialmente elevar os níveis de acessibilidade, de conectividade e de mobilidade entre as ilhas, a regulação das frequências mínimas, conferindo assim regularidade e previsibilidade aos transportes aéreos e marítimos inter-ilhas, e ajustando os preços à capacidade de esforço dos cidadãos nacionais, através da criação de mecanismos de compensação dos deficits tarifários resultantes do cumprimento da OSP de Transportes Aéreos e Marítimos Inter-ilhas, de acordo com as capacidades do país. 
 
Estava-se, de facto, perante uma verdadeira visão de transformação do sector dos transportes, que seria consolidada, a seguir a esta fase de infraestruturação, com a ideias disruptivas e estruturação de um sistema intermodal de transportes inter-ilhas mais adequado às atuais necessidades das pessoas, do desenvolvimento das potencialidades das ilhas e da competitividade do País. 
 
Em 2016, quando o PAICV entregou a governação do País, subsistiam ainda problemas e desafios, mas o certo é que havia uma Estratégia, havia um Rumo claro e que uma Extensa e Complexa Agenda vinha sendo implementada, já com ganhos irrefutáveis a vários níveis. Mais, essa agenda vinha sendo implementada em concertação com os principais parceiros de desenvolvimento, como por exemplo: o GAO, o Banco Mundial e o BAD.
 
No processo de conceção, de formulação e de condução dessa Agenda, nunca se perdeu de vista que a adequação das políticas de transportes, sobretudo o desafio da estruturação do sistema de transportes inter-ilhas eficaz e eficiente, às necessidades hodiernos do País, levaria o seu tempo e que a caminhada exigiria sacrifícios que teriam que ser suportados por todos os cabo-verdianos, pois os ganhos seriam igualmente sentidos e partilhados por todos.
 
Desafios como a continua modernização, a clarificação e o reforço do quadro regulatório que estabelece os grandes marcos para a organização do serviço público de transportes intra e inter-ilhas (operado por operadores públicos ou privados) e a ligação ao mundo para potenciar os demais sectores da economia como a agricultura, o comércio e o turismo, sempre alicerçados numa filosofia de prestação de serviço com segurança, regularidade, previsibilidade e preço justo, que garanta a confiança dos utentes e dos operadores económicos, requerem uma linha de atuação inteligível, compromissória, continua e transparente, mas também a mobilização das parcerias e a atracão do investimento privado nacional e estrangeiro. Era o que se vinha fazendo. 
 
Ora o Movimento para a Democracia disse que era diferente e que fazia diferente. Que tinha uma outra visão, logo, implementaria uma outra agenda. 
 
Volvidos doze (12) meses, após as eleições legislativas, aprovados dois (2) orçamentos nesta Casa Parlamentar, continuando os transportes a ser um sector primordial para a economia das ilhas, para criar riquezas, gerar emprego e rendimentos para as famílias, esta interpelação veio a confirmar aquilo que o PAICV tem alertado: este governo não tem visão nem estratégia para um sector de extrema tecnicidade e importante para a competitividade de Cabo Verde. Aliás, ficou provado, nesta interpelação, que as medidas implementadas por este Governo, nestes 12 meses, resumem-se à substituição das administrações das empresas do sector público dos transportes, como de resto sucede noutros domínios, e sem concurso público.
 
Os resultados dessas mudanças apressadas não têm sido sentidos por ninguém: nem pelos utentes, nem pelos trabalhadores dessas empresas, nem pela sociedade em geral.
 
Ao PAICV e ao País, importava, com esta interpelação ao Governo da República, perceber qual a estratégia do Governo e da maioria para dar continuidade ao bom trabalho que vinha sendo feito e resolver os desafios que ainda persistiam. Concluímos após todo este tempo de debate, que o Governo esquiva-se, em zigue zagues, a respostas concretas, objetivas, com metas e prazos, continuando o discurso evasivo e despromovido de conteúdo e visão estratégica para o sector, fixando-se apenas pelas intenções, como se ainda estivesse em campanha eleitoral, relegando e culpabilizando o PAICV e a oposição pela falta de clarividência e soluções governativas. Enquanto se desculpam, culpando o PAICV, o povo sofre e paga o desgoverno deste Governo, e sem dar a prometida felicidade sente que o tempo lhe escapa, quando consumido 20% do mandato os resultados e as prometidas soluções teimam em não aparecer.
 
A verdade, passados 12 meses e alguns dias após as eleições de 20 de Março de 2016, os problemas são cada vez mais crescentes no sector de transporte marítimo entre as ilhas, o custo de transporte de mercadorias inter-ilhas continua elevado, há situação de quase total descontinuidade das ligações de Cabo Verde com a nossa sub-região Oeste Africana e com o continente Africano, a Companhia Aérea Nacional continua com os mesmos problemas, sem solução, sem reestruturação e nem concurso para privatização, acumulando passivos com sucessivos recursos ao mercado para financiar a Gestão.
 
Há dias ficou-se a saber, através de um deputado da maioria na Rádio Nacional que afinal a solução que têm para a companhia nacional é exatamente aquela que o último Governo do PAICV plasmou na Carta de Politica de Transportes e que vinha sendo implementado, apesar dos problemas, e que o MpD tanto criticou e fustigou. Mas isso, 12 meses depois de terem propalado aos sete ventos que tudo o que encontraram estava errado, que traziam as soluções no bolso, com contas feitas e que eram diferente e fariam diferente. Afinal perdeu-se tempo, gastou-se mais dinheiro a pagar os mesmos consultores, para no final concluírem que afinal a estratégia anterior estava correta. Era sim uma via de trabalho com promessa de resultados, embora levasse o seu tempo. 
 
No sector aéreo, o que funciona adequadamente foi herdado. O que era para ser melhorado com as vossas soluções, continua estagnado, em situação de gestão corrente. 
 
Resumindo: não há estratégia e não sabemos se haverá ou se em desespero de causa começaram, finalmente a ler o que encontraram e a balbuciar qualquer coisa! Não há visão! Não há metas! Não há prazos! Não se conhece, em concreto, as políticas que estejam, efetivamente em preparação ou em curso de implementação para o sector dos transportes, com especial relevância para os transportes marítimos e aéreos inter-ilhas, as ligações do País com a nossa sub-região, com os países Africanos de Língua Oficial Portuguesa, a continuidade dos projetos de reforço institucional e do quadro regulatório aplicável aos modos de transportes aéreo (neste domínio sobretudo a regulação económica), marítimo.
 
Nem tão pouco souberam responder, talvez porque não sabem ou ainda estão a estudar os dossiers, como pretendem regular o desenvolvimento dos transportes coletivos urbanos e inter-urbanos, já que tiveram muita resistência a qualquer interferência do Governo Central neste domínio, mas certamente concordarão que a qualidade, a fiabilidade e a regularidade dos transportes coletivos urbanos e interurbanos em várias ilhas e Cidades reclamam melhorias substanciais urgentes. As cidades hoje são vistas como espaços de competitividade e de inovação, as abordagens atuais das políticas de mobilidade e transportes recomendam um olhar atento às questões da mobilidade suave, de transportes mais ecológicos, menos poluidores, de partilha de meios de transportes, de soluções de transporte on-demand sobretudo para servir as áreas de baixa densidade etc. Mas não existem sistemas de transportes urbanos e interurbanos eficientes sem uma abordagem igualmente moderna do planeamento territorial e do desenvolvimento regional, que considera adequadamente as virtudes do planeamento colaborativo. Esses são desafios atuais, que requerem uma nova postura, eventualmente novas engenharias institucionais e muita disponibilidade para integrar o cidadão utente nos processos decisórios. 
 
Em quase todas as ilhas, mesmo nas cidades da Praia e do Mindelo, é tempo de olharmos mais atentamente para estas questões, nesta década da segurança rodoviária, urge que medidas sejam tomadas para que os transportes urbanos e interurbanos sejam mais modernos, regulares, baratos e seguros. A quantidade de vidas que se perdem nas estradas em Cabo Verde é inaceitável. 
 
Não pretendíamos, obviamente, obter respostas acabadas, porque já sabíamos que este Governo não tem ainda obras para apresentar, a não ser aquelas que herdou do Governo anterior e que não pôde revogar ou colocar em standby. Mas esperávamos ao menos uma visão clara do rumo para os TACV e para o subsector dos transportes aéreos e aeroportos; o rumo e a visão para o subsector marítimo e portuário bem como as politicas para subsector transportes rodoviários.
 
Ficou provado e liquido, dando de barato neste debate, que os cabo-verdianos em geral e, os trabalhadores dos TACV, os armadores navais, os empresários, os hiacistas, taxistas e os camionistas tem motivos, mais do que suficientes, para preocupação porque este governo, em especial neste sector dos transportes, não sabe ao que veio, dando mostras claras de desorientação estratégica, falta de conhecimento e domínio de dossiês e sem soluções para os desafios e respostas para as ambições do país, debitando toda a culpa no PAICV, na oposição e talvez, quiçá, no povo por ter dado esta oportunidade sem estarem preparados para governar um país com os desafios de um Cabo Verde com a ambição de ser um país desenvolvido no horizonte de 2030. 
 
Acima de tudo Sr. Ministro, faltou ao Governo e principalmente ao seu PM que entrou apelidando os servidores públicos de gatos e considerando as funções públicas gordurosas linguiças, repito, faltou-vos humildade para aceitarem que nem tudo estava errado, que podiam perfeitamente ter começado a trabalhar com afinco e abertura de espirito sobre o que encontraram, sem temores, porque não traziam solução nenhuma na manga, porque não tinham contas nenhumas, porque não basta falar, mudar as pessoas (os gatos), é preciso trabalhar arduamente para que os resultados possam surgir. Mas sobretudo, porque a ciência política há muito concluiu que as políticas públicas são essencialmente incrementais, por mais que se faça a retórica do novo, da primeira vez, das soluções revolucionárias. Não vale a pena fingir que se está a demolir, a implodir tudo, para refazer o país do zero. Por isso perderam tempo, gastaram mais dinheiro dos cabo-verdianos e apresentam-nos, 12 meses depois, duas mãos cheias de nada! 
 
Sr. Ministro, já chega de retórica, é tempo de começar a assumir a governação, de gizar soluções, de deliver! Neste domínio tão sensível para esta etapa de desenvolvimento, não há espaço para mais vacilações.
 
É tempo de governar!
 
Nuias Silva - Vice-presidente GP-PAICV

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