Sr. Primeiro-Ministro;
Minhas Senhoras e meus Senhores:
Acabamos de assistir a apresentação do Orçamento do Estado para 2020, o último desta Legislatura, que teve início em 2016.
Estamos perante o orçamento da despedida de um Governo que prometeu muito e fez pouco, confiante que as promessas convertidas em compromissos, eram suficientes para uma governação bem-sucedida.
Se analisarmos atentamente este Orçamento proposto para 2020, verificaremos que o Governo continua em campanha e as promessas, refogadas, dos anos anteriores continuam a ser vendidas como novas e frescas, envoltas em outras embalagens para confundir e ludibriar os cabo-verdianos.
Isso quer dizer que o Governo, mesmo na despedida, sem mostrar ao que veio, continua a apostar em promessas falsas e em compromissos vazios, esquecendo-se que exagerou em matéria de promessas e falhou em matéria dos compromissos, enganando os cabo-verdianos.
Neste derradeiro orçamento, o quinto deste Governo, na hora que marca a preparação da despedida, o orçamento da “hora de bai”, o Governo tem que assumir, com dignidade, que falhou com os cabo-verdianos e não cumpriu com o país, que colocou nas suas mãos o seu destino durante este duros e penosos anos de governação ventoinha.
O Governo tem uma oportunidade ímpar de pedir desculpas ao país e dizer que errou nas contas, avaliou mal as responsabilidades e os desafios de governação deste país e que não conseguiu dar a tal felicidade, abundantemente, prometida na campanha eleitoral.
O Governo sabe que governar é um exercício onde se trabalha com objetivos e metas, normalmente fixados no programa do Governo e que o Orçamento do Estado é o instrumento mais importante para dar conteúdo prático ao fixado neste documento estratégico.
Uma questão incontornável é que esta maioria que nos governa neste momento, deliberada e intencionalmente, pôs de lado o programa de Governo e nos passou a conduzir numa navegação à vista, embora fora da costa, sem rumo e sem direção, numa autêntica aventura para um destino desconhecido.
Entendemos que o governo esteja a fugir para bem longe dos compromissos firmados com os cabo-verdianos, mas sabemos também que a credibilidade de um Governo é medida, principalmente, pelo grau da realização das propostas assumidas.
Senhores Membros do Governo,
Caros colegas Deputadas e Deputados
Esta é a hora de passarmos em revista onde estamos e para onde nos querem conduzir, é hora de colocarmos na balança o prometido e o realizado para podermos dar uma nota a esta governação.
Vamos fazer um pequeno exercício, peguem no programa do Governo e vamos ver o que está lá se encontra e o que já se fez.
Está ou não no programa do Governo a promessa de crescimento a sete por cento por ano. O que fizeram desta promessa?
Vão dizer a verdade aos cabo-verdianos que esta promessa não vai ser cumprida ou vão continuar a querer enganar-nos a todos que a promessa é para a legislatura que, lá na ponta final, vão conseguir materializar esta meta mesmo que martelando os dados e manipulando as metas?
Nós sabemos que vão continuar a repetir, até a exaustão, que o país está a crescer mais, mas, devem convir connosco, que a promessa não era essa. Tenham coragem e digam a verdade para este sofrido povo que merece ouvir a verdade.
Digam, ao menos que falharam nas contas, que pareciam todas feitas, mas que tinham números trocados.
Por favor, não joguem no cenário de esquecimento das pessoas porque este povo, graças a Deus, tem boa memória e, normalmente, está muito atento às empolgadas promessas da campanha eleitoral.
O Governo e a maioria devem também estar lembrados da promessa do aumento anual de vencimentos para repor o poder de compra das pessoas, anualmente.
Temos que colocar esta promessa também na lista de compromissos não cumpridos. O Governo tem que demonstrar estar disposto a corrigir o erro, garantindo, pelo menos uma única vez, um amento de salário para todos e não ficar pelo único ajustamento de 2,2% no Orçamento anterior que cobriu, apenas, uma parte reduzida do pessoal da Administração Pública, que comporta um total de cerca de vinte mil servidores do Estado.
Outra promessa firme era a de criar, anualmente, nove mil empregos ou postos de trabalho decentes.
Senhor Primeiro Ministro, o que é feito deste compromisso?
Que avaliação devemos dar ao Governo se em vez de criar postos de trabalho e gerar emprego, esteve a destrui-los? Que nos diz deste mais um compromisso falhado? Ou será que vão continuar a insistir que os estágios profissionais são empregos?
Aqui seria bom também se o Governo falasse verdade para o país inteiro e se redimisse de mais este compromisso. O povo cabo-verdiano quer conhecer as causas e ouvir as explicações pelo não cumprimento desta promessa.
É que se o Governo não falar agora perderá todas as oportunidades de esclarecer este mistério à população.
Outra promessa era reduzir a pobreza para um dígito e a erradicação da fome e da pobreza extrema pela via da promoção do crescimento.
A situação não só não melhorou como piorou e conduziu Cabo Verde de uma classificação de campeão e exemplar no combate à pobreza para um país com pobreza a aumentar de forma galopante, para além de a FAO nos vir a integrar na lista de países onde mais de 13.000 pessoas passam por situação de fome.
Senhores membro do Governo:
Se querem ser levados a sério este é o momento de todas as confissões e de reconhecer os erros e falhas e pedir desculpas aos cabo-verdianos. Pedir desculpas é também um ato de dignidade.
Uma outra promessa que não passa despercebida é a de colocar Cabo Verde na lista dos dez primeiros países pequenos e insulares melhores classificados no índice do desenvolvimento humano.
Onde foi parar esta promessa ou entrou também na lista dos compromissos adiados? A grande verdade é que cada vez menos se ouve falar destes compromissos antes proferidos com entusiasmo e hoje silenciosamente ignorados.
Senhor Primeiro Ministro deve estar também lembrado da promessa de melhorar o ambiente de negócios e integrar Cabo Verde no top 50 do Relatório do Doing Business.
Acontece que em vez de uma progressão, ainda que lenta, para a materialização desta meta, registamos recuos e a degradação, claramente vista, dos índices da competitividade do país.
Estamos perante uma promessa adiada, não cumprida e retirada da lista de materialização.
Deem-nos, pelo menos, uma explicação pela não materialização deste compromisso.
E os compromissos em torno da pensão social?
Vamos ficar apenas neste reduzido montante de pensão social ou vamos ter pensões mais ajustadas ao momento atual?
Mesmo no que diz respeito à cobertura geral verificamos que nem vamos chegar a mais meia centena de beneficiários, deixando muita gente de fora num momento em que mais as pessoas necessitam, num cenário de três anos consecutivos de seca.
Podíamos enumerar muito mais promessas direcionadas para a juventude com mais oferta de emprego, mais formação e mais bolsas de estudo, etc.
Podíamos lembrar também daquelas propostas antigas de retirar o IVA da água, da energia e do turismo que também foram engavetadas ou esquecidas, sem qualquer pudor ou sem o mínimo de peso na consciência. Antes o discurso era claro em como estas medidas teriam efeitos benéficos na redução do preço desses fatores para aumentar a competitividade do país, das empresas e diminuir o esforço e o custo de vida das famílias?
Podíamos também falar dos transportes marítimos e aéreos envolvendo os negócios pouco transparentes em torno dos TACV ou da concessão dos transportes marítimos como mais uma promessa falhada.
Podíamos perguntar também onde pára o compromisso de taxa zero de imposto para as micro, pequenas e médias empresas.
O que registamos é uma verdadeira caça e perseguição fiscal, obrigando a formalização de todos os pequenos negócios, transformando-os em empresas, aumentando as estatísticas de empresa, para se ficar bem na fotografia, mas sugando os magros proventos dos operadores.
É neste contexto que vimos os táxis a pagar mais, os hiaces a pagar mais, os cabeleireiros e as barbearias a pagarem mais, em fim, tudo mais, na cobrança e tudo minguado na distribuição.
Podemos falar também das promessas para Chã das Caldeiras que foram usadas para engodo eleitoral e totalmente esquecidas neste momento. E aqui queríamos deixar a proposta de se fixar um período de isenção de impostos para todos os investimentos daqueles que querem refazer a sua vida económica nesta localidade à semelhança do que é concedido para outros investidores. Poderia ser 5 ou 10 anos de isenção até refazerem as suas vidas. Antes tinha se falado nisso e como não foi escrito já foi esquecido e os investidores de Chã também não se tem escapado desta febre da perseguição fiscal do Ministério das Finanças.
Por tudo isso podemos concluir que a avaliação do Governo é negativa porque traiu a confiança do povo, beliscou a esperança das pessoas e pôs em causa a credibilidade das promessas desta maioria, sem palavra.
Sabemos que o PAICV é uma boa âncora e tem servido de desculpas para o insucesso desta maioria, numa autêntica fuga à responsabilidade, refugiando-se nas críticas à governação anterior, mas sabemos também que as maiorias são eleitas para trabalhar e não para passar um mandato inteiro a culpabilizar os outros que já não estão no poder.
Saibam que o caminho está a terminar, o tempo está a esgotar-se e vão ter que prestar a vossa própria conta.
Obrigado!
Praia, 28 de novembro de 2019
Rui Semedo – Líder da Bancada Parlamentar