O PAICV, enquanto um partido responsável, não poderá deixar de assumir as suas responsabilidades perante os fenómenos políticos, sociais, económicos ou outros que poderão ter impacto no futuro destas ilhas.
Aliás, é o que se espera de uma oposição patriótica, democrática, atenta e construtiva com grandes responsabilidades na conformação do destino destas ilhas.
Temos dito e repetido que o país não está bem e, invariavelmente, a maioria que governa o país neste momento ou não presta atenção às críticas da oposição ou tem enfiado a cabeça na areia, tal qual avestruz, fingido que nada está a acontecer.
Enquanto isso aumenta-se, a olhos vistos, a tensão social e emergem da sociedade movimentações que indiciam que as pessoas estão a chegar ao seu limite de suportar o autismo do Governo e a narrativa gasta do partido, que o suporta, em como tudo está bem e que apenas a oposição não consegue enxergar.
Um pouco por todo o país tem-se apercebido sinais de descontentamento e insatisfação traduzidos em atos de massa nas ruas, cada vez mais expressivos, em quase todos os pontos do território nacional e com contornos imprevisíveis.
Quem governa um país, como Cabo Verde, cuja estabilidade e paz social são capitais de principal grandeza, não poderá ignorar o que vem acontecendo e muito menos desprezar ou menosprezar a insatisfação, a revolta e as súplicas das pessoas que reivindicam a resolução dos seus problemas e as respostas para as questões que as afligem no seu quotidiano.
As manifestações, em si, não são más porque podem ser interpretadas como sinais de vitalidade da nossa democracia, que não se esvazia nos partidos políticos, embora pilares fundamentais nas democracias modernas, mas que se extravasa para a sociedade para significar, claramente, que somos uma democracia de partidos mas também uma democracia da sociedade e dos cidadãos.
O que não está bem no meio de tudo isso é a atitude da maioria que ou tenta culpabilizar os outros, designadamente, a oposição, ou tenta desvalorizar ou banalizar estes fenómenos quando não tenta impedir a organização destes mesmos atos.
Toda esta atitude pode configurar uma tentativa de passar um atestado de menor idade e incompetência das pessoas para além de desmerecer o nível de maturidade da sociedade que autonomamente pode se organizar para fazer face a situações diversas e demonstrar a sua insatisfação perante as dificuldades impostas por uma governação cujos resultados não correspondem a sua expectativa.
Minhas Senhoras e meus Senhores,
Já dizia o ditado “que quem semeia vento colhe tempestade” e o que vivemos hoje é consequência de um conjunto de atos desajustados que tem tido impacto direto no nível de confiança das pessoas nas promessas, nas propostas e nos compromissos dos governantes.
Não é difícil descortinar que os cabo-verdianos, para além de desiludidos, se sentem defraudados, perante os compromissos eleitorais assumidos, pelo MPD antes, em campanha eleitoral e, posteriormente, em programa de governação, programa esse engavetado e esquecido para dar lugar a outras promessas avulsas, desconectadas com a realidade e lançadas ao ar como boias de salvação para camuflar os apuros em que, permanentemente, o governo se sujeita.
Com efeito, o MPD ganhou as Eleições assumindo uma serie de compromissos com os cabo-verdianos.
E esses compromissos se traduziram, depois da vitória, no Programa de Governo apresentado no Parlamento, em 3 partes:
1) Um Programa de Governação de curto Prazo
2) Programa de Governo para o mandato – de 5 anos
3) Programa de Governo para a década – de 10 anos.
No Programa de Governo de Curto Prazo – feito à medida e no rescaldo da campanha eleitoral, de forma massiva – o Governo assumiu, fundamentalmente, o compromisso com a) um novo modelo de governação e uma mudança da forma de exercício do poder, b) o aumento do rendimento das famílias, c) a promoção de medidas ativas de emprego e a resolução do problema de financiamento às Empresas, d) a promoção da segurança e e) a resposta aos desafios de Chã das Caldeiras.
Entretanto, a primeira medida do novo modelo de governação e mudança na forma de exercício do poder político foi a revogação da Lei dos concursos públicos, para os Cargos de Direção Superior, seguida da colocação de fundadores/Dirigentes/Cabos Eleitorais do MPD em todos os lugares-chave da Chefia Superior do Estado, das Empresas, dos Institutos Públicos e dos Serviços Públicos, e a continuidade de acumulação de altos cargos na APUB com o exercício de cargos políticos.
E essa atuação foi acompanhada do corte de apoios às organizações da sociedade civil, o arquivamento do Combate ao nepotismo, a fragilização dos poderes das autoridades reguladoras e o condicionamento da comunicação social que se quer submissa, dócil e ao serviço do poder!
Para agravar a situação o governo montou um programa refinado de propaganda, às expensas do erário público para tentar anestesiar as pessoas e vender gato por lebre, como se as pessoas não sentem o que realmente acontece em sua volta.
Todos ouvem que o País está a crescera a 5% mas, não sentem os efeitos na sua vida pessoal e não veem os seus rendimentos a aumentar. E não aumentam porque não se fez a atualização anual dos salários e pensões, prometida, os custos dos bens essenciais e dos serviços essenciais dispararam, o Rendimento de Inclusão prometido para 25 mil pessoas, chegou ainda a apenas 2.500 famílias, e o aceso à saúde se transforma, cada mais, em um luxo.
Tudo isso faz, seguramente, aumentar a precariedade social, alimentar as frustrações, projetar as insatisfações e agudizar o nível da revolta das pessoas.
A precariedade também existe a nível do emprego, com a destruição de mais de 15 mil postos de trabalho- em contraponto com os 45 mil empregos prometidos – e a substituição dos empregos dignos, por estágios profissionais.
O País não está a conseguir gerar empregos dignos, porque não há uma visão, nem uma estratégia de desenvolvimento, com aposta nos sectores estratégicos.
Se as pessoas não estão satisfeitas é porque o país não vai bem e se o país não vai bem a atitude mais sensata é parar, ouvir, ver, avaliar e corrigir o rumo.
Não valerá a pena apontar o dedo aos outros, vitimizar-se e colocar a culpa nos outros porque a realidade é muito mais do que aquela que a nossa imaginação projeta para a nossa própria autossatisfação.
Temos todos que ser papazes de desenhar um modelo de governação das ilhas voltado para o desenvolvimento integral do país e para a satisfação das necessidades dos cabo-verdianos.
Conquistamos ao longo dos anos a unidade nacional, a coesão territorial e um país de todos os que vivem nestas ilhas e o grande desafio da atualidade é garantir a preservação destas conquistas, que são essenciais, para o desenvolvimento sustentável destes grãozinhos de terra, enquanto um capital fundamental sobre o qual se projeta o futuro.
Temos que ser capazes de analisar onde falhamos e o que é que tem que ser, urgentemente, feito para garantir o desenvolvimento deste país, sem grandes convulsões sociais e com oportunidades para todos e, para isso, temos que lançar um olhar sereno atento e responsável sobre o que estará na origem dos acontecimentos recentes.
Temos que ser capazes de aprender com os nossos próprios erros, tirar os ensinamentos dos fenómenos que estão a acontecer na nossa sociedade e transformar a situação vigente numa oportunidade para encontrar as respostas mais ajustadas e mais adequadas para os reais problemas das ilhas e das pessoas.
O governo tem que agir e não deixar se surpreender com situações como as invasões de casas no Sal ou no Fogo que demonstram claramente o desespero e o desacreditar das pessoas.
As pessoas que ocuparam as casas quiseram demonstrar que a atitude do governo em abandonar aqueles investimentos e votá-los à destruição não é o melhor caminho.
Esperamos que o governo tenha aprendido a lição, invista naquelas construções e distribua as casas para as pessoas que, desde há muito, alimentam o sonho de viver numa casa digna com a sua família.
Se as pessoas estão a agir desta forma é porque perderam a esperança e não há mal maior, em qualquer país, que a destruição dos sonhos e o assassinado da esperança do povo.
Obrigado
Praia, 17 de julho de 2019